Era uma vez uma garotinha que desejava nada mais do que tocar as estrelas do céu. Nas noites claras sem luar, ela se debruçava na janela do quarto e ficava olhando para as milhares de luzinhas espalhadas pelo céu, imaginando como seria se pudesse ter nas mãos uma delas.
Numa noite morna de verão, quando a Via Láctea brilhava mais do que nunca, achou que já não agüentava mais esperar - tinha de tocar numa ou duas estrelas, fosse como fosse. Pulou da janela e partiu sozinha para ver se conseguiria satisfazer seu intento.
Ela andou, andou muito, e muito mais ainda, até que chegou um moinho de vento, cuja roda girava, moendo os grãos.
- Boa noite! - disse ela para a mó. - Eu gostaria de brincar com as estrelas do céu. Você viu alguma por aqui?
- Ora! Vi, sim! - resmungou a mó. - Toda noite elas brilham no meu rosto; a luz vem desta lagoa e não me deixa dormir. Pode mergulhar, minha jovem, que você vai encontrá-las.
A menina mergulhou na lagoa e ficou nadando até cansar os braços, e teve de parar, mas não conseguiu encontrar estrela alguma.
Ela, então, se dirigiu à velha mó:
- Desculpe, mas eu não acho que esta lagoa tenha estrelas!
- Bem, tinha sim, até que você mergulhou e agitou a superfície da água. - retrucou a mó.
A menina saiu da lagoa, procurou se secar o melhor que pôde e partiu de novo pelos campos afora. Depois de algum tempo, chegou a um riacho de águas murmurantes e pedras cobertas de musgo.
- Boa noite, riachinho! - disse ela, educadamente. - Estou tentando alcançar as estrelas do céu para poder brincar com elas. Você viu alguma por aqui?
- Ora! Vi, sim! - sussurrou o riacho. - Elas ficam cintilando a noite inteira nas minhas margens e não me deixam dormir. Entre na água, minha jovem, que você vai encontrá-las.
A menina entrou, ficou andando pelo riacho um bom tempo, subiu nas pedras cheias de musgo, mas não conseguiu encontrar estrela alguma. Dirigiu-se, então, ao riacho, com a máxima delicadeza:
- Desculpe, mas aqui não parece haver estrelas.
- Você está dizendo que aqui não tem estrelas? - replicou o riacho. - Pois há muitas estrelas por aqui, sim. Eu sempre vejo. Tem noite que cobrem toda minha superfície, daqui até a velha lagoa do moinho. São tantas que nem sei o que fazer com elas.
E o riacho continuou se lamentando, acabando por esquecer-se da garotinha, que aproveitou e saiu de fininho, tomando os campos outra vez.
Passado algum tempo, sentou-se para descansar numa campina. Deve ter sido a campina das fadas, porque num piscar de olhos cerca de cem fadinhas precipitaram-se a dançar sobre a relva. Não eram maiores do que os cogumelos, mas estavam todas vestidas de ouro e prata.
- Boa noite, Pequenas Criaturas! - cumprimentou a menina. - Estou tentando alcançar as estrelas do céu. Vocês viram alguma por aqui?
- Ora! Vimos, sim! - disseram as fadas. - Elas aparecem todas as noites em meio à relva. Venha dançar conosco, mocinha, que você vai encontrar quantas quiser.
Convite aceito, pôs-se a dançar. Entrou na roda das Pequenas Criaturas e dançou, dançou, dançou. A pouca luz permitia ver perfeitamente a relva, mas ela não conseguiu ver nenhuma estrela. Continuou dançando até a exaustão e acabou caindo no meio da roda.
Já cansei de tentar e não consigo alcançá-las aqui embaixo. Se vocês não me ajudarem, não vou arranjar nunca uma estrela para brincar.
- Ahn! - suspiraram as fadas. Uma delas se aproximou e pegou a mão da menina: - Se você está mesmo determinada, continue em frente. Siga sempre em frente, e não deixe de pegar a estrada certa. Peça ao Quatro Pés para levá-la ao Sem Pés, e diga ao Sem Pés para levá-la até a Escada Sem Degraus, e se você subir lá...
- Vou chegar até as estrelas? - gritou a mocinha.
- Se você não chegar lá, chegará em outro lugar qualquer, não é mesmo? - A fadinha deu uma boa risada e todas elas desapareceram.
A menina retomou o caminho, esperançosa, e logo encontrou um cavalo selado, amarrado a uma árvore.
- Boa noite! - disse ela. - Estou tentando alcançar as estrelas do céu e já andei tanto que até os ossos me doem. Você me daria uma carona?
- Não sei de estrelas do céu. - retrucou o cavalo. - Só estou aqui para atender ao pedido das Pequenas Criaturas.
- Mas eu acabo de vir de lá e as Pequenas Criaturas me mandaram pedir ao Quatro Pés para me levar até o Sem Pés.
- Quatro Pés? Sou eu! - relinchou ele. - Monte aí e vamos embora.
E os dois se foram, e andaram muito, andaram tanto que saíram da floresta e chegaram à beira do mar.
- Eu trouxe você até o fim da terra, e isso é tudo que Quatro Pés pode fazer. Agora, preciso voltar para casa.
A menina apeou e começou a andar pela praia, tentando imaginar o que fazer, até que um peixe maior do que todos os que já tinha visto na vida veio nadando até bem pertinho dos seus pés.
- Boa noite! - disse ela. - Estou tentando alcançar as estrelas do céu. Você pode me ajudar?
- Sinto muito, mas não posso. - falou o peixe, soltando borbulhas. - A não ser que você tenha ordem das Pequenas Criaturas.
- Mas eu tenho. Elas disseram que Quatro Pés me traria até o Sem Pés, e que Sem Pés me levaria até a Escada Sem Degraus.
- Ah, bom! Então, está tudo bem. Suba nas minhas costas e segure firme.
E partiram os dois - tchibum! - dentro d'água, tomando um caminho que reluzia na superfície e parecia conduzir ao fim do mar, onde ele se encontra com o céu. Distante dali, a garotinha avistou um lindo arco-íris surgindo do oceano e indo acabar no céu, onde brilhavam todas as cores do mundo, tons de azul, de vermelho e de verde, uma maravilha de ver. Quanto mais se aproximavam, mais brilhava, até que ela precisou proteger os olhos de tanta luz.
Finalmente, chegaram até o início do arco-íris e a menina pôde ver que era na verdade uma estrada ampla e iluminada, subindo íngreme em direção ao céu, e lá na outra ponta, bem longe, avistou umas coisinhas brilhantes dançando.
- Daqui eu não posso passar. - disse o peixe. - Isso aí é a Escada Sem Degraus. Suba, se conseguir, mas segure-se bem. Essa escada não foi feita para pés humanos, entende?
A menina agradeceu e pulou das costas do Sem Pés, que foi-se embora espadanando pelo mar afora. Ela começou a subir no arco-íris. Subiu, subiu, subiu. Era difícil. A cada passo que dava para cima, parecia escorregar dois para baixo. Mesmo depois de ter conseguido deixar o mar para trás, lá embaixo, bem longe, as estrelas do céu pareciam estar mais distantes do que nunca. Mas pensou: "Não vou desistir. Já cheguei até aqui, não vou voltar agora."
E continuou subindo. A temperatura foi baixando, mas o céu foi ficando cada vez mais claro, até a menina perceber que já estava chegando perto das estrelas.
- Já estou quase chegando! - gritou entusiasmada.
E, de fato, de repente ela chegou à pontinha do arco-íris. Olhou em volta e em todas as direções viu estrelas dançando. Corriam de um lugar para outro, de cima para baixo, de frente para trás e brilhavam nas cores mais variadas ao redor da menina.
- Puxa! Cheguei! - sussurrou ela baixinho. Nunca tinha visto uma coisa tão bonita; e ficou ali, olhando maravilhada para aquilo tudo.
Mas em pouco tempo percebeu que estava tremendo de frio e, ao olhar para baixo, não viu mais a terra, perdida na escuridão. Quis encontrar sua casa, mas não dava nem para ver as luzes das ruas ou das janelas em meio àquele breu. Começou a sentir-se um pouco tonta.
"Não vou embora sem ter tocado ao menos numa estrela", pensou ela. Colocou-se na ponta dos pés e esticou o braço o mais que pôde. Esticou ainda mais um pouco... e, de repente, uma estrela cadente passou zunindo pertinho dela. A menina tomou um susto tal que perdeu o equilíbrio!
E caiu, e foi caindo, caindo, escorregando pelo arco-íris. Quanto mais descia, mais o ar esquentava e mais sonolenta ela se sentia. Abriu enorme bocejo, soltou um pequeno suspiro e, sem perceber, entrou em sono profundo.
Quando acordou, estava em sua própria cama. O sol adentrava pela janela e os pássaros entoavam seus cantos matinais, voando de galho em galho.
- Será que eu toquei mesmo nas estrelas? Ou será que foi tudo um sonho?
Sentiu que havia algo na mão e abriu-a, com a palma estendida para cima. Uma luzinha brilhou e num instante desapareceu. A menina sorriu contente, sabendo que aquilo era um restinho de poeira das estrelas...
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