Um
menino andando na rua encontrou um homem sentado na calçada.
O
menino ia da escola para casa. O homem descansava depois de um dia duro de
trabalho.
-
Moço, que horas são? – perguntou o menino.
O
homem disse que não tinha relógio e, para falar a verdade, nem sabia ver as
horas.
O
menino não entendeu.
O
homem explicou:
-
Não sei para que servem aquele ponteirão e aquele ponteirinho. Eles giram,
giram e giram, mas não consigo entender direito como coisa funciona.
-
Mas é tão fácil! – espantou-se o menino. O ponteirinho marca as horas e o
ponteirão marca os minutos. Por exemplo: se o ponteirinho está no dez e o
ponteirão está no cinco, isso quer dizer que são 10 horas e 25 minutos.
O
sujeito balançou os ombros.
-
Mas qual é o dez e qual é o cinco? Não sei ler os números.
O
homem tinha idade para ser pai do menino.
-
O senhor não conhece os números?
-
Nem os números, nem as letras.
-
O senhor não sabe ler?
-
Nem ler, nem escrever.
O
menino espiou aquela passoa sentada na calçada.
-
às vezes na rua, - disse o homem – olhando as letras dos cartazes, eu pergunto:
o que será que elas dizem? Outras vezes, na banca, fico admirando as revistas,
os jornais… queria tanto poder ler as notícias, entender o que se passa no
mundo, ler os letreiros dos ônibus e saber onde eles vão…
O
homem suspirou.
-
Queria tanto ir para baixo de uma árvore, abrir um livro e ler uma história…
Um
automóvel entrou na curva soltando uma fumaça preta.
-
Eu não sou daqui – continuou o sujeito. Minha cidade fica depois da serra,
pegando a estrada, passando a outra serra e depois a outra, lá longe, perto do
mar.
E
seus olhos brilhavam tristes.
-
Às vezes, fico me lembrando de casa, de minha mãe, meu pai, meus irmãos…
O
menino procurou um lugar para sentar.
-
Você sabe escrever? – quis saber o homem.
-
Já sou quase da terceira série.
O
outro sorriu:
-
Tenho uma noiva lá na minha terra. Ela é uma princesa. A coisa mais linda do
mundo. Um dia a gente vai se casar…
Examinou
o menino:
-
Escreve uma carta pra mim?
Dizendo
sim com a cabeça, o menino tirou um caderno e uma caneta esferográfica do fundo
da mochila.
O
homem foi falando. O vento soprava morno. O homem contou que a cidade era
grande. Contou que estava sozinho. Contou que sentia medo. Contou que quase
tinha juntado um dinheirinho, que estava morto de saudade e que no final do
ano, se Deus ajudasse, pegava o ônibus e voltava para casa.
O
menino escreveu tudo com letra caprichada, dobrou o papel e entregou ao homem.
A
Lua havia surgido sem ninguém perceber.
O
menino precisava ir embora.
O
homem apertou a mão do menino.
Ricardo
Azevedo. In: Nova Escola, ano 12, n. 100. São Paulo, Abril, março/97.
Simplesmente amei!
ResponderExcluirMe inspirou bastante, e fiquei com um gostinho de quero mais pelo final rs.❤
Esse vonto e do Ricardo Azevedo
ResponderExcluirBoa história!
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